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Língua Afiada

O que é stress madrinha?

O que é stress madrinha?

Perguntou-me uma vez o meu afilhado, deveria ter uns 4 anos na altura e eu pela primeira vez não tive uma resposta imediata, pois é difícil explicar um conceito tão vasto e tão complicado, mas lá lhe disse que era quando as pessoas estavam muito cansadas porque tinham muitas coisas para fazer, pouco tempo, muitas responsabilidades e que sentiam stressadas quando não conseguiam fazer tudo.

Não foi a melhor explicação mas ele percebeu e quando alguma coisa não corria como ele queria começou a dizer, ainda hoje diz – Que stress!

 

O stress dele é ligeiramente diferente do dos adultos, mas não deixa de ser stress, a sobrecarga que colocam nos miúdos é incrível, seja porque têm dias preenchidos numa rotina desenfreada, seja pela pressão pelo sucesso escolar e nas atividades extracurriculares.

Acredito que muito do stress das crianças lhes é transmitido pelos pais, o stress é contagioso, se estamos muito tempo num ambiente de stress acabamos por sentirmo-nos stressados, ansiosos, o contrário também é verdade, um ambiente descontraído e relaxante faz com que sejamos mais descontraídos.

Encontrar um ambiente relaxado com pessoas relaxadas nos dias de hoje é quase impossível, com a exceção dos períodos de férias, a maioria das pessoas vive em estado permanente de stress.

 

Porquê?

Porque a sociedade e nosso modo de vida fazem com que assim seja.

Trabalhamos demasiadas horas, muito mais do que as 8 horas previstas no contrato de trabalho, seja porque ficamos até mais tarde, seja porque levamos o trabalho para casa, estamos contactáveis 24h por dia, durante os 7 dias da semana, por telemóvel e por e-mail.

Alguém nos paga essa disponibilidade? Em 99% dos casos não, mas mesmo que nos pagassem, compensaria?

Não.

Se já é difícil fechar a porta do escritório e desligar do trabalho, daquela reunião que temos de preparar, daquele problema que temos de resolver, como conseguimos desligar se a qualquer momento podemos ser interrompidos por uma mensagem do trabalho, uma que nos faça sair da mesa de jantar a meio da refeição, colocando aquela emergência acima de tudo o resto.

Não é possível, quando estamos sempre ligados ao trabalho, não conseguimos desligar totalmente, é uma espécie de stand by, consome menos recursos, mas consome sempre alguns e basta carregar num botão, neste caso uma chamada ou e-mail, para ligarmos imediatamente a 100%, sem pré-aquecimento, sem compasso de espera.

Este estado de alerta permanente não nos deixa verdadeiramente desligar e isso faz com que não desfrutemos dos momentos de lazer, com que não consigamos relaxar e descontrair, pois há sempre uma possibilidade, mesmo que ínfima, de sermos contactados.

 

Vivemos apressados, sempre com pressa, urgência de chegar a um lugar, no trabalho, a maioria das pessoas trabalha sob pressão de prazos, objetivos, com margens mínimas para erro e sem perdão para derrapagens nas datas-limite.

O chamado “deadline” porque prazo limite não é suficiente, importamos um termo que carrega em si a palavra morte, bem sabemos que é uma morte figurada, mas que representa muitas vezes a morte de emprego ou até de uma carreira.

Fala-se muito de qualidade de vida, trabalha-se para ter uma vida melhor, dar uma vida melhor aos filhos, entenda-se ter mais bens e mais objetos de luxo, permitir dar tudo o que os filhos necessitem e queiram, de preferência colégios e universidades reputadas e muitas atividades extra.

 

Mas será isso ter qualidade de vida?

Valerá o esforço de não ter vida própria?

Temos cada vez mais luxos e confortos, mas temos cada vez menos o conforto básico de termos tempo para nós, para fazermos o que bem entendemos sem dar satisfações a ninguém, o luxo de desligarmos do mundo sem tentativas de interrupções e pedidos de satisfações.

Até a qualidade do sono diminui, os avanços da medicina permitem-nos tratar doenças e outrora impensáveis, para quê? Para chegarmos à velhice acabados e desgastados de tanto stress, de tanta pressa, para dizermos aos mais novos – vive devagar se viveres depressa a vida também passará depressa.

 

Hoje temos 20 anos, um dia acordamos com 30 e quando menos esperamos estamos nos 60, cansados, fartos de uma vida de trabalho, mas a fazer um esforço para cumprir os anos mínimos para reforma, uma reforma que de dourado só terá o nome, porque as diversas maleitas causadas por anos a fio de noites mal dormidas, refeições rápidas e pouco saudáveis, rotinas impensáveis e stress diário tirarão qualquer brilho aos anos merecidos de descanso.

 

O que é stress madrinha?

Hoje responderia simplesmente:

- É a vida meu amor, é a vida.

Férias – Stress outra vez!

Todos os anos é um filme para decidir as datas das férias, novo filme para decidir o destino de férias, é quase sempre tudo marcado em cima com altos níveis de stress à mistura.

Este ano já tivemos o nosso stress, que felizmente acabou por correr bem, não sabendo o que o futuro nos reservava para as férias seguintes tratei de aproveitar as duas semanas como se fossem as únicas, em boa hora o fiz.

Temos duas semanas de férias marcadas a meio de Julho, mas neste momento, por razões diversas, não podemos decidir se mantemos as datas, se alteramos, se guardamos os dias, se marcamos alguma coisa.

Estamos num impasse e só 4 dias antes da data teremos alguma luz sobre o que fazer, não é grave, mas pensei que conseguiria decidir ainda esta semana, esperar mais uma semana irrita-me.

Para além disto tudo stressa-me perceber que este ano está literalmente a voar, já passou metade e eu estou longe de atingir metade dos objetivos propostos, aliás estão todos tão distantes, parece que quanto mais perseguimos um sonho, mais ele se afasta.

Serão os sonhos como o amor? Quanto mais se procura, menos se encontra?

Onde fica a luta pelos sonhos?

Para algumas pessoas tudo parece fácil, para mim tudo parece difícil, até as coisas boas, até as férias me dão stress porque com elas vem sempre a incerteza de datas compatíveis e destinos comportáveis.

Isto não é normal, mas a minha vida está longe de ser normal, anda sempre do avesso.

 

Não sou uma super mulher

Nunca consigo fazer tudo o que tenho planeado, há sempre um imprevisto, alguma coisa que demora mais tempo que o esperado, é raríssimo o dia em que me deite e pense – conseguiste! Conseguiste fazer tudo o que te tinhas proposto fazer.

Sei que esta sensação se deve em parte à minha mania de achar que posso sempre fazer mais um bocadinho e que consigo fazer tudo, deve-se à minha auto competição que me diz sempre vá lá esforça-te que vais conseguir derrotar o tempo.

Raramente consigo porque o meu cérebro e as minhas capacidades têm limites e por mais que eu gostasse de conseguir fazer algumas coisas de forma mais rápida, simplesmente não é possível, as coisas demoram o seu tempo.

 

Por exemplo, ontem ao preparar o jantar, estávamos os dois fixados na carne que teimava em não grelhar enquanto todos os acompanhamentos já estavam prontos, a mesa posta, a cozinha arrumada, só faltava mesmo a carne terminar de grelhar e estávamos ali esfomeados e a carne sem cozinhar.

 

O meu dia-a-dia é sempre uma correria, saio de casa a correr seja porque me demorei mais a preguiçar, porque decidi mudar a roupa à última da hora, ora sujei a blusa com base ou me borratei com a máscara de pestanas e tenho de recomeçar de novo ou porque não sei das chaves, quando se tem o tempo contado ao segundo é muito fácil atrasar-nos e não, não posso sair de casa sem maquilhagem.

O meu trabalho é imprevisível, é quase impossível de planear porque por mais listas de tarefas, por mais prioridades que tenha, estão sempre a criar-se novas prioridades e o telefone, essa invenção do demo, não para, é uma dor de cabeça constante.

 

Saio do trabalho quase sempre com a cabeça a mil, trânsito, mais um stress diário, falta de civismo por todo lado, uma constante irritação. Depois de mais de 10h fora de casa, considerando que já houve uma altura em que passava 12, sinto-me sortuda, há ainda um sem fim de coisas para fazer antes do descanso, há jantar para preparar, roupas para tratar, casa para arrumar, dia para as compras, dias para exercício, não há um dia em que não tenha algo para fazer antes da hora de jantar.

 

Janta-se, muitas vezes mais tarde do que o esperado, mas o jantar quer-se sem pressas, é momento de relaxar, colocar a conversa em dia, falar de trivialidades, do trabalho, da atualidade, tenta-se que os smartphones fiquem longe para não atrapalharem a conversa.

Arruma-se a cozinha, arruma-se mais uma ou outra coisa, estende-se ou guarda-se roupa, a rotina é diferente todos os dias, mas não deixa de ser rotina, escolhe-se a ementa do dia seguinte e segue-se o banho.

 

Quando chego a esta altura já só quero sentir a água quente a correr pelas costas, vestir algo confortável e sentar-me no sofá, não há paciência para passar os 3 cremes de corpo das pernas, das mamas e dos pés, colocar o sérum, o creme de noite, o creme de olhos, colocar o creme de pentear, o protetor de cabelo, secar o cabelo com o secador e depois passar a prancha e finalizar com um óleo.

É banho, no máximo um óleo no corpo, máscara no cabelo porque caso contrário não o consigo pentear e um ar do secador para que não fique com uma juba.

 

Quando me sento só quero desligar um bocadinho o cérebro, mas ainda há tempo para alinhar alguns detalhes da vida, há sempre coisas a resolver, pequenas decisões a tomar, posto isto é hora de desligar, uns minutos ao final do dia em que desligo da minha vida para preparar o cérebro para dormir, às vezes resulta, outras nem por isso, deito-me com a cabeça a fazer planos de planos.

 

Chega o fim-de-semana, se a semana tiver corrido bem temos tudo encaminhado em casa, é tempo de lazer, estar com a família, com os amigos, mas há sempre alguma coisa a tratar, seja comprar uma prenda de aniversário ou encher o depósito de gasóleo, dar um ar mais composto ao jardim ou escovar as gatas, há sempre coisas a fazer em casa, por isso se não saímos iremos estar presos nessas coisas.

Se tenho alguns momentos de descanso só quero aproveitar para dormir mais uma hora, ler um pouco, desfolhar a revista que está há um mês por ler, organizar os papéis da carteira, fazer a lista do supermercado.

 

Até me considero uma mulher organizada e metódica, mas ao pé de algumas mulheres que conheço sinto-me uma completa desgraça, sempre impecáveis, cabelos sempre esticados, maquilhagem impecável com direito a batom e a eyeliner, unhas sempre pintadas, roupas impecáveis e variadas. Não, não estou a falar de desocupadas, estou a falar de mulheres com 2 e 3 filhos que têm um trabalho como o meu, que são fadas do lar e ainda têm tempo para fazer trabalhos manuais.

 

Estas super mulheres intrigam-me, como conseguem ter sempre tudo pronto e organizado? Será que é algo que vamos adquirindo com o tempo? Haverá algum manual que nos ensine a ser assim?

Estarei a dormir horas a mais?

Terei de organizar o meu tempo de forma diferente?

Estarei a ver a vida da perspetiva errada? Terei de inverter prioridades?

Estará o meu espírito a contrariar esta tendência?

E vocês sentem-se super mulheres?

Ou sentem-se à parte deste mundo onde tudo parece perfeito e fácil?

 

Quando eu for grande quero ser uma super mulher.

(Ou talvez não.)