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Língua Afiada

Animais nos restaurantes e agora?

E agora à boa maneira portuguesa os proprietários e os fregueses que se entendam, pois a lei não é esclarecedora e animais de estimação podem ser cães e gatos, mas também uma série de outros animais desde de que sejam tidos com companhia.

A omissão pode ser explicada por se pensar que se subentende que se está a falar principalmente de cães e gatos, mas o bom senso é algo que não impera no mundo, Portugal não é exceção e pode muito bem gerar-se a confusão.

 

Seria pior se a lei não permitisse que os proprietários decidam ou não se admitem animais e se estes não pudessem limitar o seu número, convenhamos que ter 40 pessoas e 20 cães dentro de um espaço pode não ser recomendado, se lhe juntarmos um ou outro gato reunimos todos os ingredientes para um vídeo viral - a destruição do restaurante do Manel.

 

Apesar das lacunas da lei não vejo que isto seja um grande problema por dois motivos, primeiro porque creio que a maioria dos espaços não permitirá o acesso a animais, porquê? Simples, porque os obrigaria a ter uma série de cuidados de limpeza e higiene adicionais que implicam custos de tempo e dinheiro, segundo porque as próprias pessoas não se fazem acompanhar dos animais de estimação para toda a parte.

Mas há sempre um lado mais negro, porque apesar de estarmos a defender os direitos de nos fazermos acompanhar pelos nossos fieis amigos, há muitos donos que não são fieis aos seus animais e não os tratam como seria de esperar, mau-cheiro, pulgas, carraças, chocas de pelo não convivem bem com comida e bebida e se mais uma vez deveria imperar o bom senso, sabemos que não podemos contar com ele.

 

A lei é omissa, mas não é preciso ridicularizar, extremar posições e ter ataques de pânico porque se tem medo de iguanas e tarântulas, até quem tem medo de cães se encontra protegido já que existem regras a cumprir.

Esperemos que entretanto a lei seja complementada com algumas alíneas ou artigos mais específicos, não obstante por mais ampla que seja a lei nunca cobrirá todas as situações e não educará os donos dos animais, nesse aspeto há ainda um longo caminho a percorrer.

Entretanto podemos levar os nossos animais a passear no parque e depois bebermos um café ou mesmo almoçar num restaurante que nos permita ter o nosso amigo ao nosso lado, já sabemos que se queremos ir jantar a um restaurante da moda é melhor deixarmos o amigo em casa, pois mais certo é que a sua entrada seja vedada.

 

Espero que se aperte a legislação e a fiscalização dos dejetos dos animais, especialmente dos cães, porque isto dos direitos é para ser levado a sério, mas não menos a sério se devem levar os deveres, convenhamos que num parque ou se deixam correr crianças ou se deixam correr animais, ninguém quer que o seu filho conviva animadamente com as fezes do pastor alemão e do pincha, para não falar da praia, é bom que se definam regras e espaços, mas também que se faça respeitar a lei a que permite, mas também a que proíbe.

Os portugueses e o dinheiro dos outros

Em Portugal há um estigma que paira sobre os ricos e afortunados, quem tem dinheiro, nem precisa ser muito, basta ser mais do que a pessoa que o está a criticar é sempre mal visto, ou porque tem pais ricos, ou porque teve sorte, ou porque é saudável, ou porque não teve nenhum percalço na vida, mérito e esforço raramente são associados ao sucesso e à fortuna.

Em casos de grande sucesso inventam-se até causas maldosas para o aparecimento do dinheiro, pode ser contrabando, roubo, fraude, exploração, é tudo uma questão de imaginação. Não sou ingénua ao ponto de pensar que estes casos não existem, existem claro e conheço alguns, mas nem todos os ricos enriquecem ilicitamente e conheço vários casos que enriqueceram graças ao sentido de oportunidade, esforço e inteligência.

 

Irrita-me profundamente este estigma e irrita-me ainda mais que se olhe para quem tem mais do que nós com inveja e desprezo, como se a pessoa tivesse feito algo de mal, isto piora substancialmente quando não há um historial que justifique o sucesso.

Quando existem cunhas, favores, heranças, as pessoas toleram, mas quando se sobe a pulso e se ganha mais do que a média não se é tolerado, existe sempre uma espécie de desdém de quem olha e vê um exemplo de uma pessoa que tinha tudo para levar uma vida banal, mas de que alguma forma consegue brilhar.

Odeio este pensamento mesquinho e tacanho dos portugueses, pessoalmente adoro estar rodeada de pessoas bem-sucedidas, não é por pessoas ricas monetariamente, mas por pessoas que souberam enriquecer em ideias, que conseguiram ir mais além do esperado, pessoas que sobressaem ou pela inteligência ou pelo trabalho árduo, admiro muito quem com pouca formação e com pouco apoio conseguiu alcançar o sucesso.

 

Este pensamento pequeno não afeta só as pessoas de sucesso, afeta todas as pessoas, na medida que qualquer pessoa que esteja ou pareça estar melhor na vida do que o típico pobre português é alvo de escrutínio e crítica.

Não é preciso estar-se bem de vida, ganhar-se muito bem, basta que se tenham prioridades e gastos diferentes, porque as pessoas nunca avaliam as diferenças, avaliam apenas o que ostros têm ou fazem que eles não têm ou não fazem.

Pessoalmente já tive alguns dissabores com estas comparações ridículas, das nossas relações somos dos casais que mais viajam, eu acho que viajamos pouco, conheço quem viaje muito mais, mas para pessoas que raramente saem de Portugal e que só costumam fazer férias uma vez por ano, nós parecemos muito viajados e ricos, já que associam o viajar a ter dinheiro.

Não fazem eles ideia que às vezes gastamos menos do que eles nas férias, porque pode-se visitar um país por 500€ ou por 1000€ tudo depende de quando se compra, como se compra e o que se compra.

 

Não pagamos casa (ainda) e por isso assumem que temos mais rendimento disponível e que o gastamos, se é verdade que temos mais rendimento disponível, também é verdade que não o gastamos, porque fazemos de conta que não o temos, porque sabemos que um dia o dinheiro que não nos sai da conta para a prestação de uma casa, será o bolo para uma casa.

Por isso reviro os olhos sempre que alguém me diz – Ah vocês viajam porque não pagam casa!

Ninguém assume que viajamos porque poupamos para viajar ou porque nos esforçamos a trabalhar, a desculpa é sempre porque temos menos despesas do que eles ou porque temos a sorte de ganhar mais, mesmo que ninguém saiba quanto ganhamos e quais são as nossas despesas.

 

O que essas pessoas não sabem é que poupamos muito mais do que a maioria pelo simples facto de não fazermos ideia de quanto iremos necessitar para uma casa, quem tem um crédito, sabe quanto lhe sai ao final do mês da conta, embora haja flutuação nas taxas de juro, há um valor base e há um valor a pagar e podem organizar a sua vida em função desses valores.

Quando não se faz ideia do valor tende-se a juntar o mais possível, pois tudo o que se junta pode ser importante no futuro, odeio pensar em dívidas e juros, nunca compramos nada a crédito e só essa ideia dá-nos arrepios aos dois, por isso poupamos, muito.

Poupamos por opção e por hábito, não valorizamos bens materiais, não nos deslumbramos com marcas, não valorizamos automóveis, apesar de ambos gostarmos de tecnologia só investimos em gadgets quando necessário e são sempre compras altamente ponderadas, as únicas coisas em que abrimos os cordões à bolsa é na alimentação e em experiências, especialmente as que envolvem viajar.

 

Gosto da nossa vida, temos um bom equilíbrio entre o que ganhamos e gastamos e como o gastamos, mas essas opções, essas prioridades parecem agastar muitas pessoas, não chega a ser inveja, porque a maioria dessas pessoas querem-nos bem, é uma espécie de irritação que têm, que sinceramente não consigo entender, pois o que os outros ganham ou gastam a mim não me afeta rigorosamente em nada.

Tomara eu estar rodeada de ricos, todos eles bem-sucedidos, além de saber que nunca precisaria de socorrer nenhum familiar ou amigo financeiramente, não teria ainda de levar com as suas irritações.

A maioria dos portugueses não poupa, não sabe onde gasta o dinheiro, não faz uma boa gestão financeira, mas adora gerir o dinheiro dos outros, mesmo que não saiba quanto é, o dinheiro dos outros é sempre mais, estica, só o deles é que não.

 

Getto & GastamWikipedia: Getto & Gastam or alternatively Getto y Gastam are a rap/reggaeton duo made up of Getto from Río Piedras and Gastam from Ponce, Puerto Rico respectively. The duo is signed to Buddha's Productions and have been involve in the infamous clash with Pina Records.

É de boas famílias! E depois?

Os portugueses estão colados a este pensamento provinciano exacerbado pela sabedoria popular que “quem sai aos seus não degenera”, como se os filhos fossem clones dos pais, ou uma extensão dos mesmos, esquecem-se que há maças podres em todas as macieiras e que “no melhor pano cai a nódoa”.

 

Hoje, ao ler o artigo "Subir na vida sem berço de ouro é mais difícil em Portugal" do Público não consegui deixar de pensar neste facto tão antiquado, é desolador confirmar o que já sabia, em Portugal as origens ainda ditam e condicionam o nosso destino.

 

Sempre o soube por experiência própria, que mais do que a inteligência, a competência, a determinação era importante ter o apoio de pessoas importantes, num meio pequeno, pequeno especialmente a nível de mentalidade, é impressionante como a família influencia o acesso ao emprego, chegar a um cargo de relevância em qualquer empresa implica ter pais influentes ou alguém conhecido que intervenha a nosso favor.

 

Se não tivermos isso podemos optar pela a hipocrisia, a bajulação e a imposição, colocar-nos estrategicamente no meio dos influentes, nem que para isso seja preciso ser o empregado de serviço, suportar humilhações e ser pau para toda a colher, apenas com o intuito de ganhar o direito de estar no seu meio, almejando um dia ser reconhecido como um deles, não por mérito mas por continuidade e rotina, até lá vai-se alimentando de migalhas.

 

Um caminho alternativo é esforçar-se a quadruplicar, trabalhar acima do limite e dar tudo, mesmo tudo para que alguém no topo perceba que afinal está ali alguém de valor, tendo sempre a sombra que se por um acaso um filho, um sobrinho ou até um filho do amigo quiser o lugar estão tramados.

 

Ainda mais antiquado é procurar um lugar ao sol pelo amor, perdão pelo casamento de interesse, conheço vários casos que para além de escolherem cuidadosamente as amizades, escolheram com quem casar na esperança que isso lhes abrisse a tão ansiada porta que dá acesso à escada para o topo.

 

Quem não tem estômago e feitio para bajular, quem escolhe amizades por afinidade e casar por amor, só tem duas opções: esforçar-se quatro vezes mais do que o necessário ou expandir horizontes.

 

E não é preciso sair de Portugal, basta sair do local onde todas as pessoas conhecem as nossas origens e após ouvirem o nosso sobrenome demoram menos de dois segundos a fazer um juízo de valor da nossa personalidade, das nossas capacidades e até a decidir se cumprimos ou não os requisitos para o cargo.

 

Não é de estranhar que depois estes marginalizados pelas suas raízes se tornem em piores chefes que os seus chefes, já diz o ditado “não sirvas a quem serviu, não peças a quem pediu”, este comportamento torna-se num ciclo vicioso, sem que consigamos ultrapassar esta herança castradora da competitividade e mobilidade social.

 

Escrevi esta semana sobre a percentagem altíssima de racismo biológico em Portugal, não é surpreendente que ela exista quando ainda existe um tão grande preconceito biológico entre a própria população portuguesa.