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Língua Afiada

A vergonha dos Estágios Profissionais

O Jornal Notícias lançou a bomba da fraude dos estágios profissionais, mas será que é verdadeiramente uma bomba?

Para mim definitivamente não é, durante a minha carreira profissional realizei dois estágios profissionais, o primeiro correu como suposto, terminei o estágio, permaneci na empresa até avançar por vontade própria para outro projeto, tudo seria perfeito, não fosse o facto de empresa passar apagar-me uma ninharia a seguir ao estágio, o que só por si deveria ser ilegal.

 

O segundo estágio que fiz foi especializado e realizado através de uma associação empresarial, contou com 3 meses de formação específica em sala e 9 meses de trabalho numa empresa, decorreu com normalidade até ao ponto em que a empresa achou que já não necessitava de trabalho especializado, 12 meses de estágio, dos quais 9 na empresa a que se seguiu um contrato de 6 meses a ganhar quase metade do valor e depois a carta para o desemprego.

Se a minha experiência foi má? Posso dizer que sim, senti que se aproveitaram do programa, da minha experiência e conhecimentos e que depois me descartaram, mas comparada com a experiência de alguns colegas de formação a minha integração na empresa pode ser considerada um sucesso, porque exerci as funções para as quais fui contratada, enquanto alguns fizeram um pouco de tudo menos o que estava estipulado, desde a colega que não tinha trabalho e servia cafés e tirava fotocópias à colega que em vez de apoiar a gestão de um infantário realizava trabalho de auxiliar de educação.

Isto foi antes da crise, numa altura que as empresas se davam ao luxo de contratar licenciados para desempenhar as tarefas mais básicas nas empresas, apenas para terem acesso aos benefícios, feitas as contas pagavam menos a um licenciado do que pagariam a um indiferenciado e ficava bem contratar pessoas formadas mesmo que não tirassem partido das suas competências.

 

Supostamente os estágios teriam sido criados para permitir que empresas com poucos recursos financeiros pudessem contratar colaboradores especializados, dinamizar as empresas com recursos jovens e com formação específica era o principal objetivo, esqueceram-se que seria muito difícil essas empresas darem continuidade ao ordenado do estagiário assim que o estágio terminasse. Apenas um pequeno grande detalhe.

Deste panorama passou-se rapidamente a encarar os estágios profissionais como uma medida de apoio ao emprego, uma forma de empregar momentaneamente centenas, milhares de recém-licenciados. Com a crise o valor das bolsas de estágio diminui significativamente, assim como a contribuição das empresas para a mesma, o que aconteceu?

Empresas andam de estágio em estágio a recrutar mão-de-obra especializada ao preço da chuva, mas isto não é suficiente para uma entidade patronal gananciosa e ávida de lucro.

 

Então qual é a nova moda?

– Exigir parte da remuneração que o estagiário recebe do Estado.

 

Gostava de dizer que fiquei escandalizada com a notícia, mas não fiquei porque já conhecia este esquema criminoso que ultrapassa todos os limites da ética profissional e honra pessoal de qualquer empregador.

Segundo o JN “há muitos patrões que não só exigem aos jovens estagiários que lhes devolvam a comparticipação da empresa no salário (que oscila entre 20% e 35%), como ainda lhes impõem que sejam eles a pagar a taxa social única (23,75%) que corresponde à entidade empregadora. Ou seja, dos 691 euros ilíquidos mensais que um estagiário com licenciatura recebe, até 400 podem acabar, por debaixo da mesa, nas mãos dos empresários que os contratam.”

Resumindo os estagiários estão a pagar à empresa para trabalhar a troco de umas migalhas e de uma oportunidade de ganharem experiência profissional.

Os estágios profissionais são mais uma ferramenta para as entidades patronais promoverem o emprego precário e instável, exploram os estagiários, fazem chantagem psicológica, obrigam-nos a cometer uma ilegalidade e como sempre quem precisa baixa as orelhas, é conivente com o esquema e os patrões continuam a encher os bolsos.

E esta realidade é denunciada e tudo continua na mesma, porque os nossos brandos costumes assim o ditam, quem precisa cala-se, sobrevive numa sociedade em que não existem oportunidades só oportunistas.

 

O povo esqueceu-se que é ele quem mais ordena, sim os fracos, os pobres, os empregados são muito mais que os patrões, todos parecem esquecer-se que os patrões sem eles não têm em quem mandar.

Este país precisa de parar, refletir e agir, deveríamos exigir tabelas de ordenados iguais às da função pública, planos de carreira, progressões de carreira obrigatórias e aumentos de acordo com o nosso desempenho e os resultados da empresa.

Se as empresas não podem pagar ordenados condignos e dar boas condições aos seus trabalhadores é porque são mal geridas, que encerrem, só assim se criam novas oportunidades para novas empresas e novos negócios rentáveis para todos.

Não podem existir empregados para serem mandados, não podem existir funcionários meramente a exercer funções, não podem existir trabalhadores a debitar trabalho, devem existir colaboradores que colaboram com a empresa para que ela seja sustentável e próspera para todos.

Será assim tão difícil perceber isto quando existem tantos exemplos de sucesso na Europa?

Não, só que mudar esta realidade dá muito trabalho, incomoda muita gente que não pode ser incomodada e o povo como incomoda-se hoje e amanhã esquece, deixa-se ir com a corrente até se afogar.

Pode ser que quando estivermos todos afogados se lembrem que sem empregados não há patrões.

10 comentários

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    Psicogata 23.08.2016 12:13

    Exatamente, não é escândalo nenhum, toda a gente tem conhecimento das fraudes nos estágios, embora a devolução de dinheiro à entidade patronal ultrapasse todos os limites, quando soube desta situação confesso que me saltaram os olhos das órbitas.
    O que não entendo é que como existe tanta gente a sujeitar-se a isto.
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    Heidiland 23.08.2016 12:29

    A devolução do dinheiro à entidade patronal também me chocou. As pessoas sempre se sujeitaram às coisas mais parvas ou por desconhecimento dos seus direitos ou porque pensam que vão ganhar alguma coisa com isso.
    O principio dos estágios profissionais era bom, mas foi completamente adulterado pelas más empresas. O estado deveria controlar melhor os estágios profissionais e penalizar fortemente as empresas que não cumprem os seus deveres.
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    Psicogata 23.08.2016 12:47

    Era necessário que os estagiários denunciassem, mas a verdade é que ninguém faz queixas formais com medo de represálias. E sujeitam-se na esperança de conseguirem um emprego, nem pensam que um patrão assim nunca valorizará condignamente o seu trabalho.
    Eu acho que as pessoas não pensam direito só pode.
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    Heidiland 23.08.2016 13:05

    Se reclamares formalmente precisas de apresentar provas e todos sabemos que as empresas estão mais que protegidas. A lei favorece a empresa e não o trabalhador. Quem não conhece mulheres que são despedidas por engravidarem!? E quantas empresas vimos serem penalizadas por isso!?
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    Psicogata 23.08.2016 13:11

    Eu sei, mas neste caso bastava recusarem-se a entregar o valor.
    O problema é que as pessoas não sabem usar a informação, no caso das grávidas a lei está do lado delas.
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    Heidiland 23.08.2016 13:19

    Não é bem assim! Tenho três amigas/colegas que foram despedidas todas da mesma maneira. Estavam a trabalhar numa empresa e assim que informaram a entidade patronal que estavam grávidas foram subtilmente descartadas. A empresa alegou que não precisavam mais dos seus serviços. Todas tentaram apresentar queixa, mas foram informadas que os contratos era temporários. Elas basicamente era contratadas pelas empresas de trabalhos temporários e não pela empresa A ou B.
    Se a lei favorecesse as grávidas não tinhas tantas mulher com receio de engravidar.
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    Psicogata 23.08.2016 13:23

    Com contratos através de empresas de trabalho temporário nunca estamos protegidos de coisa nenhuma, somos temporários, mas mesmo num contrato a termo, a grávida pode causar dificuldades à empresa se alegar que foi despedida pela sua condição.
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    Heidiland 23.08.2016 13:35

    O problema está em conseguires provar as intenções da empresa. O patrão nunca explica o verdadeiro motivo que foste dispensada. Falta seriedade no mercado laboral.
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    Psicogata 23.08.2016 13:38

    Isto qualquer dia só à paulada.
    Antigamente quando um patrão abusava da autoridade levava um murro bem dado e um atestado de trapaceiro, as pessoas aplaudiam e diziam bem feito. Agora ninguém defende a honra e os bons costumes que só contam para as frases bonitas do código civil.
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