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Língua Afiada

Curiosidade: como tratam os portugueses as empresas estrangeiras?

Tenho uma grande curiosidade de como os portugueses tratam as empresas estrangeiras e as pessoas que lá trabalham.

Sempre trabalhei em empresas portuguesas e sempre lidei com pessoas desde fornecedores, clientes, parceiros e consumidores.

 

Dos fornecedores não há muito a escrever, há-os bons e há-os maus é tudo uma questão de pesquisa, filtro e seleção, um processo que pode ser demorado e com alguns percalços, mas com alguns erros e ajustes conseguem-se encontrar boas empresas em praticamente todas as áreas.

 

Dos parceiros existe ainda menos a escrutinar, se são parceiros têm interesses em comum e mesmo quando existem pontos de vista distintos as situações resolvem-se pelo que é benéfico para ambas as partes.

Quando escrevemos sobre clientes, refiro-me a clientes como empresas e a consumidores como clientes finais o quadro muda de figura, e não é um retrato romântico.

 

Sou a primeira a acusar as empresas e os próprios portugueses de má gestão, a má gestão engloba muitas vertentes e pode ter vários significados, na minha opinião não significa automaticamente má qualidade do produto/serviço e ou falta de organização e muito menos vontade de ludibriar os clientes.

Da minha experiência a má gestão das empresas portuguesas assenta maioritariamente em três falhas: na falta de visão a longo prazo, na inexistência de planeamento e na má gestão de recursos, sejam humanos, sejam materiais, prever e traçar estratégias de crescimento, planear, gerir os recursos de forma a obter ganhos máximos são fatores críticos para o lucro que falham em muitas empresas.

 

A nossa maior vantagem competitiva é simultaneamente o nosso calcanhar de Aquiles - o desenrasque, às vezes é esse desenrasque que provoca o caos numa produção ou que atrasa os serviços planeados, “o alguma coisa se arranja”, o não saber dizer que não é muitas vezes mais prejudicial que benéfico.

É esta prontidão em ajudar, fazer, vender que complica o dia-a-dia das empresas, que mal geridas, têm normalmente elevados custos fixos e poucos recursos humanos para dar conta do trabalho, entram numa espécie de ciclo vicioso que faz com que não sejam competitivas.

 

Não obstante todos estes problemas de gestão e outros, não considero que as empresas portuguesas e as pessoas que lá trabalham sejam piores do que as outras, não entendo o escárnio e a facilidade com que clientes e consumidores se referem às empresas e marcas portuguesas, muito menos as comparações negativas em relação a concorrentes estrangeiros.

Em primeiro lugar assumem que todas as empresas são de vão de escada e que com um simples telefonema conseguem falar com o “patrão” e que com arranjinhos se podem fazer alterações à sua vontade.

 

Quando não conseguem o que querem atiram as típicas respostas do costume:

“Vê-se mesmo que é uma empresa portuguesa.”

“Assim vão longe, vão ficar sem clientes.”

 

Quando comparam com empresas ou produtos concorrentes estrangeiros as pérolas aumentam de nível.

“Não têm stock? Mando vir isso de Espanha e chega amanhã” ou “Encomendo da China e chega na próxima semana”.

“Não dão preços por telefone? Então não vos compro nada.”

“Não vendem a público? Então vou comprar uma marca estrangeira.”

 

A situação piora claramente quando acusam as empresas de querer enganar os clientes ou de não saberem fazer o seu trabalho.

“O senhor (a) não percebe nada disso.”

“Isso não pode ser assim, claramente está a tentar enganar-me.”

“Não colocaram essa informação no site, foi de propósito não foi?”

 

Este clima de desconfiança aliado à prepotência e arrogância de algumas pessoas é simplesmente impossível de tolerar.

O que gostava mesmo de saber é se os portugueses quando falam com empresas estrangeiras a operar em Portugal têm a mesma atitude, não estou a falar de reclamações, quando reclamamos de algo a própria situação tende a causar mais stress, estou a falar de um simples pedido de informações.

 

E palpites? Todos parecem ter palpites a dar sobre as empresas e os produtos, opiniões construtivas e cordiais são bem-vindas, mas opiniões arrogantes que quase sempre são acompanhadas de insultos à inteligência são completamente dispensáveis, até porque na maioria das vezes não fazem qualquer sentido.

E as pessoas que acham que percebem de todos os negócios? Como se as margens, as produções, as compras, a distribuição e vendas fossem iguais em todas as áreas de negócio.

Pior do que essas só os entendidos de serviço que acham que sabem mais do que as pessoas que trabalham diariamente na empresa.

 

Algumas situações são hilariantes, mas outras é preciso um autodomínio herculano para não só manter a educação, mas a cordialidade, pois ser mal-educados está fora de questão, mas uma resposta assertivamente fria e seca pode fazer milagres, mas claro que deverá ser sempre o último recurso, não que o cliente tenha sempre razão, mas porque queremos que ele perceba que esta errado e nada é mais gratificante do que terminar a conversa com o cliente a pedir-nos desculpa, é a prova que estamos a fazer bem o nosso trabalho.

 

Deve ser por isso que depois tenho pouca paciência para as restantes coisas da vida, esgoto-a com o trabalho.

Não conheço ninguém que lide com o público numa multinacional, mas gostava muito, mesmo muito de saber se os portugueses tratam assim as empresas estrangeiras, é uma curiosidade que me assiste.

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