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Língua Afiada

É tudo uma questão de prioridades? Não, nem sempre.

Na nossa vida tudo gira em volta de prioridades, todo o nosso dia é definido por prioridades desde que nos levantamos até à hora que nos deitamos, tudo é uma questão de prioridades e tudo tem um custo de oportunidade, já que, ainda, não é possível estar em dois locais ao mesmo tempo.

O que é verdade é que nem sempre podemos definir as nossas prioridades a nosso bel-prazer, por razões tão básicas como ter necessidades fisiológicas, por razões racionais, afinal as contas não se pagam sozinhas e por razões emocionais, procuramos sempre fazer que nos faz felizes, mas com alguma racionalidade.

 

Se fosse tudo uma questão de prioridades, a vida, pelo menos a minha, seria bem mais fácil, dormia até às 9:30h da manhã, tomava um pequeno-almoço estilo brunch, de seguida em dias alternados fazia exercício, caminhadas, ia ao salão de beleza e estética, fazia compras, comia qualquer coisa leve e trabalhava umas 3h, até por volta das 20h dedicava a cuidar e a brincar com a minha filha, depois jantava e tirava umas horas para o ócio, namorar, ver filmes, ler…

Ah vida perfeita! Infelizmente a minha conta bancária não me permite ter estas prioridades e não me venham dizer que se tivesse estabelecido ser rica como prioridade número um poderia agora estar a viver esta vida de sonho, porque tenho notícias para vocês gangue da inspiração, empreendedorismo, busca interior, coaching e afins, a vida não é um mar de rosas, calmo e povoado de flamingos e unicórnios confortavelmente sentados em mandalas com os chakras alinhados.

 

Isto tudo porquê? Porque não tenho tempo para nada e não admito que me venham dizer que é tudo uma questão de prioridades, a sério? Mas alguém pode ter prioridades com uma bebé de 6 meses? Não, a única prioridade é a bebé, que, graças a Deus e a todos os santos, tanto pedi a menina é mesmo um anjo, um doce que só visto, às vezes, juro, penso como é que tive tanta sorte?

Mesmo quando lhe alteramos as rotinas e lhe trocamos as voltas, não reclama, está sempre com um sorriso nos lábios e pronta para nos encher de mimo com um olhar terno e uma caricia sedosa com as mãos mais fofas que conheço.

 

A vida é isto um amor imensurável e um stress descomunal quando percebo que o tempo não estica e não chega para nada e que a minha bebé que deveria estar comigo o maior tempo possível é “obrigada” a estar longe por força das circunstâncias e vejo-me obrigada a inverter prioridades e a colocar a estabilidade financeira à frente da estabilidade emocional, bem sei que no fundo é porque é prioritário ter as condições necessárias para cuidar bem dela, mas isso não impede que sinta revolta e alguma culpa.

Não, não é tudo uma questão de prioridades, é mais uma questão de sobrevivência, num mundo tão evoluído, onde a tecnologia reina, as relações humanas fracassam, o tempo para a família escasseia, estamos cada vez mais reféns de um modo de vida consumista, egoísta, numa espiral sem fim onde lutamos para ter aquilo que não precisamos e que na verdade nem desejamos, simplesmente nos dizem que devemos ter.

 

Está tudo invertido, tudo do avesso, nem os milhares de estudos científicos que nos dizem com certezas o que é melhor para nós e para os nossos filhos a situação muda, continuamos a privilegiar o dinheiro, nesta roda capitalista onde os bolsos de muitos se esvaziam para encher os bolsos de poucos.

E depois quando tudo acaba é triste perceber que a vida afinal foi uma mão cheia de nada, pois o dinheiro, a riqueza, o sucesso e o poder transformam-se em miséria humana, amor, carinho, compaixão, amizade são vistas em perspetiva e o coração definha seco, sedento e faminto daquilo que não teve, mas que sempre lhe fez falta.

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