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Língua Afiada

Fragmentos #2 - Os desenhos de Catarina - Capítulo II

Como estará Catarina?

Quem não conhece o início da história poderá ler o Capítulo I aqui.

 

 

Catarina não sabia o que se passava, porque estavam aqueles polícias a tira-lo da escola a meio de uma aula? Teriam os pais tido um acidente? Tentou apertar o software de pânico no braço mas estava desativado. Estava confuso não conseguia entender o que se estava a passar.

Foi colocado numa sala branca toda almofadada, na sala existiam uma mesa e duas cadeiras, uma cama, um armário e as acomodações de um WC atrás de um biombo, tudo era branco, não havia uma única cor naquela sala além do branco.

Catarina sentiu-se triste e só naquela sala tão despedida, não é que fosse feia ou desconfortável mas era fria, não tinha vida.

Depois de alguns minutos entrou uma pessoa na sala toda vestida de branco.

 

- Catarina podes sentar-te aqui nesta mesa comigo, por favor?

Catarina, um pouco desconfiado mas obediente levantou-se do puf onde estava sentado e sentou-se à mesa de frente para o adulto na única cadeira disponível.

- Eu sou o Dr. Lance e estou aqui para te dar uma grande notícia Catarina. Foste selecionado para uma grande aventura. Com certeza já estudaste na escolha a História do Genoma, pois bem, foste selecionado para seres um representante desse grande feito que é o Banco do Genoma Humano, serás uma pessoa muito importante nas próximas comemorações.

- Eu? E assim de repente e os meus pais concordaram?

- Os teus pais foram informados e concordaram, sentem-se honrados. Faremos uma grande festa inesperada, mas neste momento não podemos estragar a surpresa e para não levantarmos suspeitas usamos a polícia para trazer os sortudos selecionados, não te magoaram pois não?

- Não, foram cordiais, só me disseram para ter calma que uma pessoa me explicaria tudo.

- E aqui estou eu para explicar. Irás ser acompanhado por uma equipa que estudará o comportamento do teu genoma, terás de usar um fato especial para conseguirmos ler os resultados. Podemos contar contigo para esta experiência?

- Sim! – Disse Catarina muito entusiasmado.

 

 

Catarina não sabia quanto tempo ficaria naquele quarto, mas os seus receios iniciais desvaneceram-se com o passar dos dias. O Dr. Lance era extremamente simpático com ela, para além dele relacionava-se com o Dr. Ney que era responsável por lhe trazer as refeições, sempre de acordo com as suas preferências, podia escolher comer os seus pratos favoritos, tinha todas as guloseimas a seu dispor e provou imensos alimentos que só conhecia dos livros, morangos, framboesas e amora, até uma banana, um fruto que julgava extinto teve oportunidade de saborear.

Há noite era visitada pelo Dr. Cari que lhe contava as novidades, dava-lhe conta das notícias, falava-lhe dos seus pais, de como estavam orgulhosos dele, dos amigos e da escola, algumas vezes lia-lhe pequenas histórias antes de dormir, frequentemente eram passagens do livro As Gerações do Futuro, uma espécie de bíblia do novo mundo.

A única situação que o preocupava era o facto de não lhe darem vitaminas, desde que se recordava tomava todos os dias aquelas preciosas e dispendiosas pílulas, sempre guardadas com extrema precaução, mas quando expos o seu receio ao Dr. Lance, ele logo o descansou dizendo que ali não era necessário tomar as pilulas porque comia alimentos ricos em vitaminas e minerais, uma opção muito mais saudável.

 

A parte do dia favorita de Catarina era a tarde, logo após o almoço uma das paredes do quarto abria-se magicamente para um pátio ajardinado com todas as comodidades que fazem uma criança feliz, no pátio existiam um baloiço, um escorrega, uma parede de escalada, uma rede de descanso, uma mesa de jogos, bancos de madeira e uma mesa de refeições, o jardim ladeado por bonitas paredes de pedra semicobertas de trepadeiras e heras tinha na parede central uma linda fonte que jorrava um fio de água cristalina constante que caía em diversos sulcados até formar um pequeno riacho que serpenteava por todo o jardim, existiam diversas árvores, plantas e flores e até um pássaro colorido, que Catarina nunca tinha visto, numa linda gaiola branca. O seu local favorito era a pérgula branca ornamentada por roseiras floridas e perfumadas, era sem dúvida um local mágico aquele jardim, Catarina nunca imaginou que as ilustrações dos livros antigos pudessem ser reais.

Em algumas tardes deixavam entrar um cão ou um gato para lhe fazer companhia, decidiu batizar todos os animais, ao cão chamou Tobias ao gato Luna e ao pássaro Mara, não sabia onde tinha ouvido estes nomes mas achava que condiziam com a personalidade dos seus novos amigos.

 

Haviam decorrido duas semanas e Catarina, apesar de longe da família, sentia-se bem, tinha a companhia dos três doutores que o tratavam muito bem e dos animais, apesar das saudades sentia-se orgulhoso por ter sido escolhido para uma experiência tão importante.

Quando as saudades apertavam, especialmente à noite, tentava contornar a angústia focando-se na alegria e orgulho que ele era para os pais, imaginava-os a serem cumprimentados e elogiados na rua por amigos e vizinhos. Várias vezes imaginou o seu regresso depois do sucesso da experiência, imaginava-se num carro a acenar ao público, ouvia a musica, as palmas, as ovações, no meio da multidão conseguia distinguir o rosto dos pais e estavam imensuravelmente felizes.

Agarrava-se a essa imagem e mesmo com lágrimas nos olhos e com o coração esmagado pelas saudades adormecia com os pais no pensamento confiante que estariam felizes e orgulhosos dele.

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