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Língua Afiada

Não devíamos trabalhar doentes

Corpo são, mente sã, é quase impossível desemparelhar os dois e nos últimos dias tenho sido a prova disso.

Estou com uma constipação ou gripe, não sei bem qual das duas maleitas me assola, que me tem deixado a mente entorpecida, se é um sacrifício levantar e sair de casa, para pensar e trabalhar é um esforço herculano, mas ninguém deixa de trabalhar em Portugal a menos que esteja prestes a entrar em coma e por isso não sou exceção, ontem trabalhei o dia todo, hoje preparo-me para fazer o mesmo e amanhã a história deverá repetir-se.

 

Trabalhar doente não é bom para ninguém, nem para o doente, nem para a empresa, nem para os colegas.

O doente em vez de recuperar em dois ou três dias prolonga a doença e o sofrimento por uma semana ou duas, há quem demore até mais a curar pois constantes diferenças de temperatura, cansaço e stress não ajudam ninguém a convalescer-se.

A empresa não fica sem o colaborador durante dois ou três dias, mas fica com um colaborador a trabalhar a 50%, 30% ou 10% durante um longo período de tempo, seria preferível acumular o trabalho de uns dias e depois ter o colaborador a 100%.

Os colegas correm sérios riscos de contágio, e são contagiados frequentemente o que leva a que existam departamentos e secções inteiras com pessoas doentes e consequentemente a trabalhar abaixo das suas capacidades.

 

Não é preciso ser um génio para perceber que trabalhar doente não constitui nenhuma vantagem, mas como sempre o sistema está contra nós, primeiro a baixa médica é uma anedota, só começamos efetivamente a ser remunerados a partir do terceiro dia de baixa, os primeiros três dias somos penalizados a 100% e só recebemos mais de 55% da remuneração se a mesma ultrapassar os 30 dias, isto faz com que algumas pessoas se tiverem o azar de serem obrigadas a estar de baixa por força maior terão sérias dificuldades em fazer face às suas despesas, especialmente quando doença implica quase sempre uma despesa avultada em medicação e em taxas moderadoras.

 

As próprias empresas de uma forma geral não lidam bem com a doença, um dia ou dois ainda demonstram empatia, mas mal percebam que a doença do colaborador lhes afeta o dia-a-dia mudam imediatamente de atitude e não raras as vezes são influenciados por outros colaboradores que fazem queixinhas por estarem a cobrir o trabalho do doente, a empatia e compreensão não adjetivos comuns no meio laboral e é frequente o regresso do doente ser atribulado e cheio de reclamações e cobranças.

Curiosamente as empresas valorizam muito a disponibilidade dos seus colaboradores, mas quando estes necessitam de faltar mesmo que seja por doença, essa disponibilidade esfuma-se e mesmo que a pessoa tenha acumuladas horas de trabalho equivalentes a cinco dias de férias, não existe boa vontade para facilitar ao trabalhador que permaneça em casa por uns dias, mesmo que o trabalhador se disponibilize para trabalhar a partir de casa.

 

Outra curiosidade é que os empregadores desvalorizam quase sempre os seus empregados, mas quando eles lhes faltam parece que lhes sai o chão de baixo dos pés, poderiam colocar a mão na consciência e valorizarem mais as pessoas e o seu trabalho, mas bom senso não faz parte da gestão e é por isso que as empresas perdem os seus melhores recursos para a concorrência e/ou para o estrangeiro.

 

Podem alegar que o português é aproveitador e que não se pode fazer cedências que logo irão aproveitar-se da situação para estarem sempre doentes quando lhes é conveniente, é verdade, mas não são a maioria, a maioria irá esforçar-se em dobro para compensar a empresa pela benesse de estar em casa sem perda de remuneração.

Tive a sorte de trabalhar numa empresa assim, em caso de doença podíamos permanecer em casa e não nos era descontado qualquer valor, chegavam mesmo a aconselhar as pessoas a ficarem um ou dois dias em casa para que recuperassem melhor porque os próprios colaboradores não queriam abusar e chegavam ao trabalho doentes, funcionava, todos dávamos de livre vontade horas a mais sem sequer nos apercebermos, vestíamos a camisola, é claro que apareceu alguém que tentou aproveitar-se da situação mas foi rapidamente chamado à atenção, era a exceção não a regra.

 

Tal como a vida o ambiente laboral só é complicado porque as pessoas insistem em complicar o que é simples, está mais do que estudado e provado que trabalhadores motivados são mais produtivos, se produzem mais podem ganhar mais e todos ganham mais a empresa e os trabalhadores, mas continuamos a insistir nas velhas ditaduras laborais, pressão, salários baixos, horários rígidos, penalizações por tudo e por nada e zero prémios, é por causa deste sistema completamente obsoleto que as empresas portuguesas estão também elas obsoletas pois não captam, não retêm bons profissionais.

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