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Língua Afiada

O decrépito estatuto dos trabalhadores portugueses

Estudo da Deco avança:

 

«Mais de metade dos trabalhadores portugueses (64%) não recebe pelas horas extra e quase um terço está em risco de esgotamento ('burnout')

42% dos trabalhadores trabalham mais de 40 horas semanais.

11% dizem-se alvo de gozo ou chacota que, segundo a Deco, dependendo do conteúdo, "podem ser considerados uma forma de assédio".

7% dos inquiridos dizem-se vítimas de discriminação (raça, género ou religião). »

 

É este o triste estado do emprego em Portugal, exploração, precariedade, pressão e descriminação, adjetivos que não se coadunam com os tempos em que vivemos, que não deveriam sequer ser equacionados numa sociedade que ser livre e justa.

Quem são os culpados?

Todos, os que criam o sistema e os que se deixam engolir por ele, temos os patrões que merecemos, a situação não é diferente da política, onde também temos os políticos que elegemos (merecemos).

A diferença é que se podemos alienar da política, ignora-la e renega-la, já não o podemos fazer em relação ao trabalho, todos, praticamente todos, precisamos de sustento e é nessa base que somos explorados, na pressão de que se não somos nós, serão outros a ocupar o nosso precário lugar.

A lei alegadamente protege o trabalhador, mas na prática a lei revela-se insuficiente, ineficaz e improdutiva, incapaz de defender o interesse do trabalhador e de lhe proporcionar as condições necessárias para ter trabalho digno e condignamente remunerado.

Os sindicatos apenas defendem os interesses dos funcionários públicos e dos trabalhadores dos grandes grupos, tudo o resto é inoperante e sem expressão, existindo profissões que não se enquadram em nenhum dos sindicatos existentes.

 

Restam os trabalhadores, se há mote que faz sentido é este “O povo unido jamais será vencido”, na frase podemos substituir povo por trabalhadores, na verdade são muito mais os trabalhadores do que os patrões e se fizéssemos valer a nossa vontade, os nossos direitos não viveríamos nesta indecência laboral.

Preocupam-se muito com o ordenado mínimo, é importante, importantíssimo, é um valor de referência e deve estar em linha com o custo de vida, não está, mas mais importante que o ordenado mínimo são os ordenados intermédios, são esses o grosso e é desses de quem ninguém fala.

É precisamente na franja de trabalhadores que ganham um pouco acima do ordenado que reside o maior problema, são pessoas com responsabilidades acrescidas, muitas delas com formação específica ou superior que trabalham sobre pressão e que recebem o que podemos considerar uma ninharia para o cargo que desempenham.

 

Não conheço nenhum estudo que relacione o burnout com o ordenado, mas acredito que estará muito centrado neste grupo que não aufere um ordenado condizente com a função que desempenha, não é difícil encontramos pessoas qualificadas e com vários anos de experiência que ganham menos hoje do que ganhavam no início da carreira, assim como não é preciso procurar muito para encontramos pessoas que trabalham debaixo de stress e pressão, sem horário de saída, 24h conectados à empresa por e-mail e telefone, presos a um função de responsabilidade, explorados e esmagados pela entidade patronal a auferirem 700€, 800€.

Não é que o valor monetário mitigue o stress e a pressão, mas apazigua o desânimo e alimenta a motivação, é importante que se pague e valorize quer horas de trabalho, quer a disponibilidade das pessoas, é preciso pagar o custo de oportunidade, o que o trabalhador perde por estar a trabalhar.

 

O stress infelizmente faz parte do nosso modo de vida, se aliarmos esse stress crónico a ordenados baixos e a falta de tempo para lazer o que nos resta? O que podemos esperar de um tecido empresarial que se baseia numa política de ordenados baixos e pressão psicológica?

Até quando será sustentável? Até quando os trabalhadores aguentarão esta pressão? Que custos para as pessoas, para a sua saúde mental e física estão envolvidos? Quanto custa ao Estado esta política em baixas médicas, em consultas, em tratamento de doenças, em reformas antecipadas, em subsídios de desemprego e rendimentos de inserção social?

 

O que podemos esperar de empresas que não se especializam, que não acrescentam valor, que se baseiam na mão-de-obra barata e não profissionalizada? Que futuro terão essas empresas num mundo global e competitivo?

O futuro é o presente, trabalhos precários, ordenados miseráveis, pressão excessiva, exploração, escravatura, sem progressão nas carreiras, sem perspetivas de mudança, é este o decrépito estado laboral que teima em persistir, sem oposição daqueles que mais prejudica.

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