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Língua Afiada

Desopilar das sequelas do Covid-19

Com a cabeça à roda, lembro-me que ainda tenho um blog para desopilar, que é possível que ao escrever consiga orientar as ideias, focar-me e quem sabe ser produtiva.

Sinto-me terrivelmente revoltada com quase tudo e todos, a situação do país é caótica, vergonhosa, são parcas as palavras para descrever a indignação, só mesmo com um chorrilho de palavrões é que se consegue expressar tamanha raiva, irritação, desespero e impotência perante toda esta situação insustentável de vermos este país afundar-se em corrupção e compadrio.

A nível social a situação não é melhor, o que é que passa com as pessoas? Parecem crianças mimadas a quem foi proibido o acesso a um rebuçado e que agora querem tomar de assalto todas as guloseimas disponíveis e empanturrar-se de açúcar como se o açúcar fosse acabar no dia seguinte.

Não sou diferente dos outros, também estou cansada do confinamento, de estar privada da minha liberdade, tenho saudades de andar sem máscara e desinfetante e tenho acima de tudo saudades das pessoas, da amizade, dos convívios, dos abraços e dos beijos, do privar com os outros sem receios, de ser simplesmente espontânea e viver.

Sinto falta do que era normal, mas não é por isso que me recuso a aceitar a realidade, o Covid-19 existe, é real, é mau, é uma pandemia com consequências sérias, é assustador o quão pouco ainda sabemos sobre o vírus e mais assustador ainda é o que esta pandemia esta a causar não só nas pessoas, mas no mundo, na economia e na distribuição da riqueza.

O Covid-19 é o Facebook da economia, veio deixar a nu tudo de mau que existe, o impacto da indústria e dos trabalhadores no ambiente, os vínculos de trabalho precários, a falta de legislação em alguns setores laborais, a dependência da China e da Turquia, a fragilidade da cadeia de abastecimento não só de bens de grande consumo, mas também de matérias-primas e ensinar-nos de uma vez por todas que a globalização é um conceito bonito nos livros, mas que na prática quando as coisas correm mal a globalização só escala os problemas.

Seria suposto aprendermos com esta pandemia, mas parece que a única coisa que fazemos é empurrar os problemas com a barriga e esperar que a China ordene a casa para voltar a ser a fábrica do mundo, só que agora a China dita os preços e quem quer, quer, quem não quer na verdade não tem grandes alternativas.

Enquanto isso as pessoas revoltam-se de igual forma com o horário do programa do Bruno Nogueira e com o discurso do juiz Ivo Rosa, afinal as duas coisas têm o mesmo impacto nas nossas vidas.

Para não variar continuamos a assistir a uma negação massiva do Covid-19 e um desafio às recomendações, as teorias são cada vez mais rebuscadas e se não fossem tão perigosas até dariam para rir.

Hoje, lia um artigo sobre as sequelas do Covid-19, pessoas que tiveram a doença há mais de um ano e ainda não conseguem viver normalmente, sentem cansaço extremo, confusão, desorientação, incapacidade de foco, os comentários das pessoas a isto causaram-me profunda tristeza e enorme revolta, como em tudo, as pessoas acham-se no direito de acusar os outros de mentirosos só porque é mais fácil acreditar que nos querem impor uma nova ordem mundial ou outra teoria qualquer que alguém se lembrou de inventar.

Tive o Covid-19 em Novembro, estamos em Abril e ainda sinto as consequências do vírus, cansaço muito acima da média, dificuldade de concentração, dificuldade em manter-me focada, perda de raciocínio, perda de rendimento no trabalho e incapacidade de realizar o multi-tasking.

Sempre consegui fazer várias tarefas ao mesmo tempo, nunca precisei de notas para me lembrar do que tinha de fazer ou comprar, agora uma simples lista de compras pode ser uma tarefa complicada pois fica sempre a faltar alguma coisa.

Esta improdutividade revolta-me e assusta-me, sinto melhorias, mas é um processo muito lento, não sei se alguma vez terei a mesma capacidade de raciocino e isso deixa-me profundamente triste, mais triste ainda me deixa a reação geral das pessoas a esta pandemia.

Junto com o cansaço e improdutividade veio a apatia, a ansiedade e a irritação, uma mistura de sentimentos que está ali no limiar do esgotamento, luto contra isso todos os dias, mas como já me disseram desde que tive o Covid nunca mais fui a mesma, perdi um brilho no olhar que nem os maiores desgostos da vida me conseguiram antes roubar.

Isto não é um vírus qualquer, não é uma gripezinha só porque se toma paracetamol, é um vírus que ataca cada pessoa de forma diferente e imprevisível, temo por eventuais consequências que possa ter na minha filha e temo que não volte a ser eu.

Tenho esperança que ficarei melhor porque farei por isso, mas não tenho a mesma esperança em relação ao mundo.

E ninguém aplaude os pais? À beira do colapso.

Desde o início que a gestão da pandemia foi malconduzida, mas o “milagre” português fez com que não tivéssemos de lidar com uma realidade tão dura como outros países, o milagre na verdade foi mais um adiamento, pois o caos acabou por instalar-se em 2021.

Os portugueses bem-comportados, são agora os rebeldes e se em 2020 se teriam desculpado erros com a surpresa, a novidade da inusitada situação, em 2021 este caos só demonstra a incapacidade de preparação e antevisão da situação.

Será que alguém acreditou que o alívio das medidas do Natal não seria catastrófico? Será que temos governantes tão incompetentes que não previram isso ou será que prefiram o aumento exponencial de casos à impopularidade, são tão incompetentes que provavelmente foi um misto das duas.

Resultado, estamos confinados novamente, como nada mantinha os portugueses em casa e nada fazia com que as empresas aderissem massivamente ao teletrabalho, fecham-se as escolas e resolve-se o problema, criando outros, até para o Governo que teve de improvisar umas férias porque o ensino à distância não estava preparado.

Inacreditável, mas não estavam preparados, a falta de preparação e planeamento deste Governo é avassaladora, devido a erros sistemáticos das autoridades estamos agora confinados e com os filhos a cargo, o dia-a-dia de muitos pais é simplesmente caótico, surreal e incomportável.

Não se consegue ser bom pai e não se consegue ser bom trabalhador, por mais que se façam turnos, que se planeie o dia, que se durma apenas 5/6h por dia, não é possível conciliar tudo de forma pacífica porque o cansaço acumula-se, a irritabilidade aumenta e o confinamento retira-nos praticamente todas as formas de descontração e descompressão que conhecemos.

Recriminar quem se queixa não ajuda em nada, só faz os pais sentirem-se mais culpados, mais inúteis e mais frustrados, o que é preciso é reconhecer que as pessoas não são imensas e não conseguem conciliar o teletrabalho com a parentalidade.

O Estado tem de perceber que as empresas não substituem a Segurança Social e que há funções e crianças que não são compatíveis, porque não se pode simplesmente generalizar e aplicar a medida a todos da mesma forma.

Teletrabalho obrigatório, não há apoio à família, mas e quem não consegue conciliar? O que faz? Recorre às faltas justificadas sem remuneração?

O que mais uma vez o nosso Governo ainda não percebeu é que agora impede uma boa parte dos pais de recorrerem a um apoio social, mas que alguns desses pais, estarão a recorrer a outro apoio daqui a uns meses, se calhar por muito mais tempo e com consequências mais graves, se a situação se mantiver muitos pais estarão com baixa psicológica não faltará muito.

Se muitas pessoas foram imprudentes e levaram a que isto acontecesse, sim, os portugueses simplesmente ignoraram todas as recomendações, há cada vez mais negacionistas e cada vez mais pessoas a desvalorizarem a situação.

 

Quando o Covid-19 nos bate à porta – Não, não é uma gripezinha

Começou com dores de cabeça, embora não seja habitual ter dores de cabeça, associei ao cansaço do trabalho acumulado com consecutivas noites mal dormidas. Ao terceiro dia acordo com uma espécie de ardor na garganta e uma dor intercostal, nevrítica, desconfiei que pudesse ser Covid-19 por causa da garganta, mas a dor parecia derivada de outra coisa, tomei um benurum e aguardei, como era sábado fiquei em casa, os sintomas amenizaram só para piorar no dia no seguinte.

No Domingo a este quadro juntou-se uma tosse seca, embora muito espaçada e uma pressão no peito, o nosso corpo não mente, percebi que algo de muito errado se passava no meu organismo, quase que sentia algo maligno a tecer uma rede dentro de mim, senti prostração, uma vontade inexplicável de vegetar, estar quieta, sossegada.

Não haviam muitas dúvidas do que se tratava, pelo que na Saúde 24 mandaram-me imediatamente realizar teste, era Domingo, só consegui realizar o teste na segunda-feira e o resultado só chegaria na quarta-feira, mas o diagnóstico estava mais que dado, estava com Covid-19.

Quando às 7:30h da manhã a mensagem chegou nem me dei ao trabalho de alcançar o telemóvel, foi o meu marido que leu o resultado, eu não precisava da mensagem, sabia bem o que sentia e a minha única preocupação era não piorar ao ponto de precisar de oxigénio.

O Moralez estava com esperança que pudesse não ser Covid-19, não sei se era esperança ou querer que não fosse, mas a nossa vontade não comanda a nossa saúde. O próximo passo foi testar a ele e à nossa filha, ele mesmo com sintomas idênticos aos meus, embora um pouco mais ligeiros, testou negativo, a nossa filha sem sintomas testou positivo.

Confinamento, isolamento e esperar que o organismo combata o vírus sem consequências.

Os últimos sintomas a aparecerem foram o nariz congestionado e a perda de olfato e paladar, uma sensação muito estranha não conseguir cheirar absolutamente nada, rigorosamente nada, não é a maior desgraça do mundo, nem sequer é o sentido mais importante, mas a vida é muito diferente sem olfato, felizmente o meu foi recuperado poucos dias depois, voltou gradualmente.

O Covid-19 não é uma gripe, nem nada que se pareça, já tive gripes daquelas bravas que me atiraram à cama durante três dias, com dores no corpo e febre alta, tudo combatível com benurum ou griponal, passando a publicidade, é uma bomba mas uma bomba que resulta e quando necessário um anti-histamínico, com o Covid-19 a experiência é bem diferente.

Àqueles que dizem que isto se cura com benurum posso dizer-vos que o paracetamol às dores do Covid-19 faz cócegas, ajuda, mas não cura e não tira as dores e o mal-estar, para a pressão e dor no peito, respiração ofegante, fadiga constante e necessidade constante de respirar fundo para compensar a falta de oxigénio não há medicamento, há quando a situação complica o internamento para fazer oxigénio e nos piores cenários a ventilação.

Houve uma noite que senti que as coisas poderiam correr muito mal, como sempre que a minha filha chora levantei-me rapidamente e acorri ao quarto dela, estava inquieta, peguei-lhe ao colo e enquanto ela sossegava eu estava a acelerar, o meu batimento cardíaco estava acelerado, comecei a sentir suores frios, a sentir-me enjoada, fraca, impotente, pois por mais que pensasse que tudo correria bem, não sossegava, estava ali naquele limbo que se sente quando se está prestes a ter um ataque de ansiedade, mas não era ansiedade, era Covid-19.

A bebé sossegou, eu regressei à cama inquieta decidida que no dia seguinte acordaria melhor, esta situação repetiu-se novamente na noite seguinte, mas com menos intensidade, aos poucos a dor intercostal foi melhorando e a pressão no peito foi diminuindo e o alívio que é perceber que já não nos dói o peito quando respiramos fundo.

Como é possível termos necessidade de respirar fundo para compensar a nossa respiração e esse simples ato de respirar ser doloroso? É mau, muito mau, o segredo é manter a calma, mas ter consciência que há um ponto em que é preciso contactar o 112.

Tive um acompanhamento espetacular da minha médica de família e da minha enfermeira, sempre presentes, sempre muito atentas e preocupadas e sempre vigilantes, se sentires dificuldade em respirar tens de ligar o 112, não podes deixar uma situação dessas evoluir.

Felizmente não chegou a esse ponto, mas tive receio que pudesse chegar, sou saudável, não tenho qualquer doença diagnosticada, mas tive sintomas, sintomas dolorosos e assustadores.

Ninguém sabe o motivo de umas pessoas terem mais sintomas que outras, talvez um dia consigam entender o funcionamento deste vírus, o que sabem é que este vírus é altamente invasivo e contagioso e que se todos formos contagiados ao mesmo tempo viveremos um caos.

A pressão no SNS já é imensa, os números não param de aumentar, mas há quem prefira focar-se nos erros dos outros para se escusar de seguir as regras e as recomendações, perdoem-me mas só consigo apelidar essas pessoas de ignorantes e estúpidas.

Não se trata de concordar com tudo, não se trata de achar que as autoridades procederam bem e atempadamente, trata-se de fazer a única coisa que podemos fazer proteger-nos a nós e aos nossos o máximo que conseguirmos.

Podemos e devermos reclamar de como esta pandemia tem sido tratada, mas não é inteligente, nem prudente realizar manifestações e a acreditar em teorias negacionistas (convenientes) e de conspiração, neste momento a pandemia existe, é real e pode ser muito dolorosa, pode tirar vidas, a economia é importante, mas de nada nos servirá ter economia se não estivermos cá ou se tivermos de viver com a saudade dos nossos.

Para mim não importa a idade de quem morre, todos podemos morrer a qualquer momento por milhentos motivos, por milhares de doenças ou azares, será que só a mim me faz confusão que uma pessoa, mesmo que idosa, se vá devido ao Covid-19 por falta de cuidados?

Acham justo que se viva uma vida longa e se vá morrer de um vírus porque as pessoas escolheram que a sua vida vale menos do que a de uma pessoa jovem?

Custa assim tanto manter a máscara na cara e manter o distanciamento social? É assim tão importante fazer tudo hoje e agora colocando em risco o futuro?

 

 

P.S. Não foi confirmada a minha fonte (pessoa) de contágio, mas terá sido em contexto laboral.