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Língua Afiada

Auto motivação no trabalho

Quando iniciamos a nossa atividade profissional ou quando mudamos de emprego estamos, regra geral, motivados, queremos demonstrar o nosso valor, expor as nossas ideias, contribuir para o crescimento da empresa e sentirmo-nos integrados, vestimos a camisola num ato de boa-fé, afinal a empresa apostou em nós, é tempo de apostarmos nela.

 

Dizem os entendidos que não devemos permanecer muitos anos no mesmo local, sob pena de estagnarmos, não poderia estar mais de acordo, ou o cargo ou empresa se apresenta como desafiador e está em constante mudança e crescimento ou acabaremos por nos conformar, criar hábitos, rotinas e até vícios prejudiciais ao nosso desempenho.

É inevitável ninguém consegue manter uma alta performance sem motivação, e se o trabalhador tem obrigação de se renovar, reinventar, crescer e evoluir, a empresa tem obrigação de lhe proporcionar um ambiente propício a esse desenvolvimento, é aqui que muitas vezes as empresas falham.

 

Não podemos exigir mais e mais a um trabalhador se não compensarmos o seu esforço, não se trata apenas de uma compensação monetária, o reconhecimento do bom trabalho é importante para que o trabalhador se sinta realizado, mas palavras de agradecimento esgotam o seu poder quando o trabalhar se vê estagnado a nível financeiro.

A componente financeira é importante, por muito que um emprego nos realize, se a recompensa financeira não acompanhar o nosso desempenho haverá um dia em que isso deixará de ser suficiente, é nessa altura que se instala a desmotivação, a inércia, o desleixo.

Existem também situações opostas, onde a recompensa financeira nos agarra ao emprego, mesmo quando não existem palavras de reconhecimento, mesmo quando existe mau ambiente no local de trabalho.

 

O ideal é ter um ambiente justo, amigável numa empresa que sabe distinguir as pessoas pelo trabalho que apresentam, onde existe uma avaliação contínua e recompensas para quem realmente apresenta bons resultados, premiar as pessoas pelo seu trabalho é a melhor forma de manter um trabalhador motivado, mas deve-se premiar pelos objetivos individuais e não de grupo e muito menos em função das horas extraordinárias.

Um dos graves problemas das empresas, mesmo as que trabalham por objetivos é não saberem em que medida cada trabalhador contribuiu para esse objetivo, colocando as pessoas em grupos, sem diferenciação, é o primeiro passo para se criarem desconfortos porque assim se criam desigualdades.

 

As empresas não são uma comunidade comunista, onde não interessa o que cada um faz, que responsabilidades tem, não se pode simplesmente dividir as recompensas equitativamente por todos, isso é nivelar o desempenho por baixo, é dizer que não à competitividade e ao crescimento pessoal de cada trabalhador dentro da empresa, é condenar as empresas ao declínio.

 

O trabalhador por mais resiliente que seja tem um limite para se auto motivar, para estar constantemente a tentar provar o seu valor quando a empresa pretende ignorar as diferenças entre a competência das diversas pessoas que integram os seus quadros, quando se chega a uma altura em que não se quer saber, em que nos limitamos a desempenhar as tarefas instituídas, sem acréscimo de valor, todos ficam a perder, mas o que as empresas não parecem perceber é que são elas as maiores prejudicadas.

 

Há um limite para a auto motivação, estou claramente à beira de ultrapassar o meu.

O decrépito estatuto dos trabalhadores portugueses

Estudo da Deco avança:

 

«Mais de metade dos trabalhadores portugueses (64%) não recebe pelas horas extra e quase um terço está em risco de esgotamento ('burnout')

42% dos trabalhadores trabalham mais de 40 horas semanais.

11% dizem-se alvo de gozo ou chacota que, segundo a Deco, dependendo do conteúdo, "podem ser considerados uma forma de assédio".

7% dos inquiridos dizem-se vítimas de discriminação (raça, género ou religião). »

 

É este o triste estado do emprego em Portugal, exploração, precariedade, pressão e descriminação, adjetivos que não se coadunam com os tempos em que vivemos, que não deveriam sequer ser equacionados numa sociedade que ser livre e justa.

Quem são os culpados?

Todos, os que criam o sistema e os que se deixam engolir por ele, temos os patrões que merecemos, a situação não é diferente da política, onde também temos os políticos que elegemos (merecemos).

A diferença é que se podemos alienar da política, ignora-la e renega-la, já não o podemos fazer em relação ao trabalho, todos, praticamente todos, precisamos de sustento e é nessa base que somos explorados, na pressão de que se não somos nós, serão outros a ocupar o nosso precário lugar.

A lei alegadamente protege o trabalhador, mas na prática a lei revela-se insuficiente, ineficaz e improdutiva, incapaz de defender o interesse do trabalhador e de lhe proporcionar as condições necessárias para ter trabalho digno e condignamente remunerado.

Os sindicatos apenas defendem os interesses dos funcionários públicos e dos trabalhadores dos grandes grupos, tudo o resto é inoperante e sem expressão, existindo profissões que não se enquadram em nenhum dos sindicatos existentes.

 

Restam os trabalhadores, se há mote que faz sentido é este “O povo unido jamais será vencido”, na frase podemos substituir povo por trabalhadores, na verdade são muito mais os trabalhadores do que os patrões e se fizéssemos valer a nossa vontade, os nossos direitos não viveríamos nesta indecência laboral.

Preocupam-se muito com o ordenado mínimo, é importante, importantíssimo, é um valor de referência e deve estar em linha com o custo de vida, não está, mas mais importante que o ordenado mínimo são os ordenados intermédios, são esses o grosso e é desses de quem ninguém fala.

É precisamente na franja de trabalhadores que ganham um pouco acima do ordenado que reside o maior problema, são pessoas com responsabilidades acrescidas, muitas delas com formação específica ou superior que trabalham sobre pressão e que recebem o que podemos considerar uma ninharia para o cargo que desempenham.

 

Não conheço nenhum estudo que relacione o burnout com o ordenado, mas acredito que estará muito centrado neste grupo que não aufere um ordenado condizente com a função que desempenha, não é difícil encontramos pessoas qualificadas e com vários anos de experiência que ganham menos hoje do que ganhavam no início da carreira, assim como não é preciso procurar muito para encontramos pessoas que trabalham debaixo de stress e pressão, sem horário de saída, 24h conectados à empresa por e-mail e telefone, presos a um função de responsabilidade, explorados e esmagados pela entidade patronal a auferirem 700€, 800€.

Não é que o valor monetário mitigue o stress e a pressão, mas apazigua o desânimo e alimenta a motivação, é importante que se pague e valorize quer horas de trabalho, quer a disponibilidade das pessoas, é preciso pagar o custo de oportunidade, o que o trabalhador perde por estar a trabalhar.

 

O stress infelizmente faz parte do nosso modo de vida, se aliarmos esse stress crónico a ordenados baixos e a falta de tempo para lazer o que nos resta? O que podemos esperar de um tecido empresarial que se baseia numa política de ordenados baixos e pressão psicológica?

Até quando será sustentável? Até quando os trabalhadores aguentarão esta pressão? Que custos para as pessoas, para a sua saúde mental e física estão envolvidos? Quanto custa ao Estado esta política em baixas médicas, em consultas, em tratamento de doenças, em reformas antecipadas, em subsídios de desemprego e rendimentos de inserção social?

 

O que podemos esperar de empresas que não se especializam, que não acrescentam valor, que se baseiam na mão-de-obra barata e não profissionalizada? Que futuro terão essas empresas num mundo global e competitivo?

O futuro é o presente, trabalhos precários, ordenados miseráveis, pressão excessiva, exploração, escravatura, sem progressão nas carreiras, sem perspetivas de mudança, é este o decrépito estado laboral que teima em persistir, sem oposição daqueles que mais prejudica.

Não devíamos trabalhar doentes

Corpo são, mente sã, é quase impossível desemparelhar os dois e nos últimos dias tenho sido a prova disso.

Estou com uma constipação ou gripe, não sei bem qual das duas maleitas me assola, que me tem deixado a mente entorpecida, se é um sacrifício levantar e sair de casa, para pensar e trabalhar é um esforço herculano, mas ninguém deixa de trabalhar em Portugal a menos que esteja prestes a entrar em coma e por isso não sou exceção, ontem trabalhei o dia todo, hoje preparo-me para fazer o mesmo e amanhã a história deverá repetir-se.

 

Trabalhar doente não é bom para ninguém, nem para o doente, nem para a empresa, nem para os colegas.

O doente em vez de recuperar em dois ou três dias prolonga a doença e o sofrimento por uma semana ou duas, há quem demore até mais a curar pois constantes diferenças de temperatura, cansaço e stress não ajudam ninguém a convalescer-se.

A empresa não fica sem o colaborador durante dois ou três dias, mas fica com um colaborador a trabalhar a 50%, 30% ou 10% durante um longo período de tempo, seria preferível acumular o trabalho de uns dias e depois ter o colaborador a 100%.

Os colegas correm sérios riscos de contágio, e são contagiados frequentemente o que leva a que existam departamentos e secções inteiras com pessoas doentes e consequentemente a trabalhar abaixo das suas capacidades.

 

Não é preciso ser um génio para perceber que trabalhar doente não constitui nenhuma vantagem, mas como sempre o sistema está contra nós, primeiro a baixa médica é uma anedota, só começamos efetivamente a ser remunerados a partir do terceiro dia de baixa, os primeiros três dias somos penalizados a 100% e só recebemos mais de 55% da remuneração se a mesma ultrapassar os 30 dias, isto faz com que algumas pessoas se tiverem o azar de serem obrigadas a estar de baixa por força maior terão sérias dificuldades em fazer face às suas despesas, especialmente quando doença implica quase sempre uma despesa avultada em medicação e em taxas moderadoras.

 

As próprias empresas de uma forma geral não lidam bem com a doença, um dia ou dois ainda demonstram empatia, mas mal percebam que a doença do colaborador lhes afeta o dia-a-dia mudam imediatamente de atitude e não raras as vezes são influenciados por outros colaboradores que fazem queixinhas por estarem a cobrir o trabalho do doente, a empatia e compreensão não adjetivos comuns no meio laboral e é frequente o regresso do doente ser atribulado e cheio de reclamações e cobranças.

Curiosamente as empresas valorizam muito a disponibilidade dos seus colaboradores, mas quando estes necessitam de faltar mesmo que seja por doença, essa disponibilidade esfuma-se e mesmo que a pessoa tenha acumuladas horas de trabalho equivalentes a cinco dias de férias, não existe boa vontade para facilitar ao trabalhador que permaneça em casa por uns dias, mesmo que o trabalhador se disponibilize para trabalhar a partir de casa.

 

Outra curiosidade é que os empregadores desvalorizam quase sempre os seus empregados, mas quando eles lhes faltam parece que lhes sai o chão de baixo dos pés, poderiam colocar a mão na consciência e valorizarem mais as pessoas e o seu trabalho, mas bom senso não faz parte da gestão e é por isso que as empresas perdem os seus melhores recursos para a concorrência e/ou para o estrangeiro.

 

Podem alegar que o português é aproveitador e que não se pode fazer cedências que logo irão aproveitar-se da situação para estarem sempre doentes quando lhes é conveniente, é verdade, mas não são a maioria, a maioria irá esforçar-se em dobro para compensar a empresa pela benesse de estar em casa sem perda de remuneração.

Tive a sorte de trabalhar numa empresa assim, em caso de doença podíamos permanecer em casa e não nos era descontado qualquer valor, chegavam mesmo a aconselhar as pessoas a ficarem um ou dois dias em casa para que recuperassem melhor porque os próprios colaboradores não queriam abusar e chegavam ao trabalho doentes, funcionava, todos dávamos de livre vontade horas a mais sem sequer nos apercebermos, vestíamos a camisola, é claro que apareceu alguém que tentou aproveitar-se da situação mas foi rapidamente chamado à atenção, era a exceção não a regra.

 

Tal como a vida o ambiente laboral só é complicado porque as pessoas insistem em complicar o que é simples, está mais do que estudado e provado que trabalhadores motivados são mais produtivos, se produzem mais podem ganhar mais e todos ganham mais a empresa e os trabalhadores, mas continuamos a insistir nas velhas ditaduras laborais, pressão, salários baixos, horários rígidos, penalizações por tudo e por nada e zero prémios, é por causa deste sistema completamente obsoleto que as empresas portuguesas estão também elas obsoletas pois não captam, não retêm bons profissionais.